Cozinha dos pastores dos Abruzos

Abruzos 1

A foto destacada é de Francesco Mengaroni, fotógrafo italiano

Os Abruzos, terra de pastores e agricultores

antigo vilarejo de Frattura
Frattura Vecchia – foto de Francesco Mengaroni

Adentrando nos caminhos de montanha da região dos Abruzos, na parte central da Itália, encontramos um território simples, rude, pedrento, onde, por séculos, os pastores e os agricultores inventaram a arte da sobrevivência, satisfazendo-se com o muito pouco que possuíam. O escritor abrucês Ignazio Silone, em seu livro “Fontamara”, conta a história de um vilarejo de montanha e de seus habitantes, agricultores muito pobres, submetidos à contínua prepotência dos proprietários da terra na qual trabalhavam.

Silone escrevia: “Superior a todos, está Deus, dono do céu. Depois vem o Príncipe, dono da terra. Depois vêm os guardas do Príncipe. Depois vêm os cachorros dos guardas do Príncipe. Depois nada. Depois ainda nada. Finalmente, vêm os pobres agricultores. E depois não vem mais ninguém”.

A transumância

Quem possuía animais podia dizer-se afortunado, à condição, porém, de ter à disposição a água para mitigar-lhes a sede e o feno para alimentá-los. Assim os pastores, enquanto no verão alimentavam as ovelhas nos verdes pastos da alta montanha, durante o inverno deslocavam a grei para áreas mais próprias ao pastoreio, às vezes fazendo muitos quilômetros sobre longos caminhos cobertos de vegetação (“tratturi“) que iam até a planice da Apúlia e ao mar Adriático.
A transumância, fenômeno social de grande importância, era regulamentada por leis especiais e regras que vinham da época do Império Romano e previam postos fiscais, lugares de descanso e alimentação, economia induzida. O poeta Gabriele D’Annunzio, em sua poesia “Os pastores”, escrevia:

Setembro, vamos. É tempo de migrar.
Agora na terra dos Abruzos os meus pastores
deixam seus lugares de repouso e vão em direção ao mar:
descem ao Adriático selvagem
que é tão verde quanto as pastagens dos montes.

A cozinha dos pastores

1935 Il pastore Michele Del Greco con il cappello nero nonno di Sandro Incurvati
O pastor Michele Del Greco (com chapeu preto) preparando a ricota, em uma foto das primeiras décadas de 1900

Segundo as lembranças de minha mãe, filha de pastor abrucês, a cozinha era caracterizada sobretudo por produtos ovinos e caprinos, como queijos, ricota e carne. Mas quem possuía uma estrebaria ou um terreno, tinha também a possibilidade de criar um porco para consumo familiar; assim tinha-se à disposição também a banha e os salames que podiam ser conservados por diversos meses e consumidos durante o ano. Nas áreas onde vivia minha mãe não era permitido o cultivo em grande escala, pois as montanhas eram íngremes e os vales estreitos, mas não era impossível ocupar um pequeno pedaço de terra para plantar hortaliças para o consumo familiar. Para fazer o pão, as mulheres dirigiam-se periodicamente ao forno a lenha do vilarejo onde, pagando um pequeno valor, preparavam o pão caseiro e os biscoitos para a família.
Um prato típico que lembro que minha avó preparava é a polenta, mais mole e cremosa que aquela do norte da Itália, com molho de tomate com linguiças e costelinhas de porco. Dentre as especialidades mais recentes da cozinha abrucesa/pastoril, citamos os “arrosticini” (em dialeto “arrišticijə” ou “rruštèllə”), constituídos de espetinhos de pequenos cubos de carne de ovelha ou cordeiro castrado, para assar na brasa.

A receita da ovelha “allu cutture

No caminho de cerca de 200 quilômetros que levava os pastores e suas ovelhas em direção à Apúlia, de vez em quando os pastores chacinavam uma ovelha, faziam-na em pedaços, e a colocavam a cozinhar juntamente com as verduras que encontravam pelo caminho.
Era uma refeição substanciosa, muito simples de preparar, nas estreladas noites ao relento pelos pastores e seus ajudantes… leia mais

Raffaella Del Greco, a poetisa das montanhas

A fonte de inspiração da poetisa e escritora Raffaella del Greco nasce do amor pela sua terra (os Abruzos), pela qual sente nostalgia, da melancolia, da fé em Deus e da trágica morte do pai, pastor de ovelhas… leia mais

Adote uma ovelha, defenda a natureza

asca

No vilarejo de Anversa degli Abruzzi, incrustado na garganta do rio Sagitário, próximo ao “Parco Nazionale d’Abruzzo“, a Cooperativa ASCA – Bioagriturismo La Porta dei Parchi está propondo uma iniciativa muito interessante, cujo objetivo é sensibilizar as pessoas para o grave problema do abandono das áreas rurais, numa tentativa de inverter essa tendência. Tal iniciativa, denominada “Adote uma ovelha, defenda a natureza”, consiste na possibilidade de adotar à distância uma ovelha abrucesa … leia mais

Conheça também a cozinha típica de Téramo, cidade do norte dos Abruzos.

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A Transumância – Fotos de Francesco Mengaroni

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